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A polêmica decisão da ANEEL sobre minigeração e consumidores optantes B

Publicado em 30 de outubro de 2020

Recentemente, a ANEEL acrescentou mais um capítulo à longa discussão sobre faturamento do grupo de consumidores, chamado "optante B", que decidem instalar uma usina solar em minigeração.

A ANEEL proibiu essa combinação agora, o que aumenta os custos com energia para esta clientela, e inviabiliza essa solução em muitos casos.

Especialistas em direito da energia discordam da decisão e da forma como ela foi tomada e prevêem uma judicalização da questão. Vamos entender do que se trata ...

Faturamento dos grupos A e B

O faturamento no Brasil conhece dois regimes de faturamento:

  • Grupo A: grandes consumidores (acima de 75kVA de demanda). Estes contratam uma demanda, pagando por ela mensalmente com um valor fixo.
    O consumo é faturado de forma variável, conforme leitura mensal do medidor. Para estes consumidores, um sistema solar consegue reduzir somente a parcela do consumo, não da demanda;
  • Grupo B: pequenos consumidores que recebem energia em baixa tensão, como residências, lojas etc. Este grupo é faturado pelo consumo somente, permitindo à energia solar uma redução maior do que no grupo A.

Para tornar o limite entre os grupos mais suave, a regulamentação criou um subgrupo, chamado "optante B": consumidores do grupo A com baixa demanda têm a opção de serem faturados como o grupo B. A precondição é que o transformador de conexão à rede da concessionárias não tenha potência superior a 112,5 kVA (veja Art. 100 da REN 414/2010).

Com uma usina solar em geração distribuída, o faturamento como optante B se torna muito mais interessante, porque a usina consegue reduzir o consumo, e a demanda deixa de ser cobrada. O consumidor ganha uma outra vantagem: a tarifa monômia, igual ao longo das 24h do dia, ao invés da tarifa binômia, com horário de ponta e tarifa bem mais alta no final da tarde.

Micro e minigeração solar

As regras para a geração distribuída diferenciam-se em duas classes:

  • A microgeração inclui sistemas com potência até 75 kW e conta com procedimentos simplificados de conexão à rede;
  • A minigeração abrange sistemas entre 75 kW e 5 MW. Nesta classe, o consumidor que deseja conectar-se à rede é obrigado a entregar estudos e instalar proteções adicionais;

O limite entre micro e minigeração foi definido em 75 kW justamente para coincidir com o limite entre grupo A e B do fornecimento de energia e faturamento.

A compensação da energia gerada é regulamentada no Art 7º da REN 482/2012. O primeiro inciso define a cobrança mínima: "deve ser cobrado, no mínimo, o valor referente ao custo de disponibilidade para o consumidor do grupo B, ou da demanda contratada para o consumidor do grupo A". Sobre o optante B não há definição e falta uma ligação do faturamento mínimo à classe da usina solar.

Optante B com usina solar: pode isso?

Precisamos considerar duas resoluções normativas:

  • a REN 414/2010, que "estabelece as condições gerais de fornecimento de energia elétrica ..." é anterior à geração distribuída e concede o direito do consumidor optar pelo faturamento no grupo B conforme critérios listados nesta REN.
  • A REN 482/2012, mesmo na revisão de 2015, não proibiu nem limitou as possibilidades para um consumidor optante B. Ela somente limita a potência da usina à potência disponibilizada pela distribuidora (Art 4º §1º).

O que não é proibido é permitido, e começaram a surgir usinas de minigeração para consumidores que já eram optantes grupo B, como também consumidores que migraram para esse subgrupo por causa da instalação da usina solar.

Ao longo dos anos, a ANEEL tomou várias decisões para casos específicos, até que publicou a Nota Técnica nº 0029/2020 onde ela descreve a combinação de minigeração com optante B como um abuso das regras que poderia trazer prejuízos a outros consumdores. No ítem 40, ela chega até a criar um vínculo entre minigeração e cobrança da demanda contratada, contradizendo a REN 482.

Em relação à microgeração não há impedimentos - ela pode ser compensada em qualquer dos grupos tarifários.

A polêmica

Fica evidente que há lacunas na regulamentação. A ANEEL argumenta, na Nota Técnica citada, que as intenções das regulamentações seriam subvertidas pela combinação minigeração - optante B.

Especialistas da área jurídica questionam essa argumentação e reforçam que a literalidade das resoluções precisa ser respeitada antes de recorrer a um conceito vago das "intenções das regulamentações". Via de regra, mudanças significativas devem ser propostas através de uma formalização das novas regras com abertura de uma consulta pública e prazo de implantação. Ainda mais que o processo da revisão da REN 482/2012 está em curso, desde a publicação das propostas um ano atrás. É justificada a pressa em criar novas regras por um Nota Técnica enquanto se espera uma revisão fundada?

Vale lembrar que estamos falando de direitos de consumidores, dos quais muitos já fizeram investimentos confiando nas regras publicadas. 

Ações das associações setoriais

As associações do setor solar não ficaram paradas. A ABGD enviou uma carta à ANEEL solicitando reconsideração do ofício citado acima. 

A ABSOLAR recomenda que cada usuário que tenha problemas com o Optante B deve encaminhar um Ofício à diretoria da ANEEL para ter um efeito de massa, o que pode ajudar para ter mais percepção de urgência e celeridade do processo. O modelo de Ofício pode ser solicitado à equipe do Técnico Regulatório (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.).

Além disso, a ABSOLAR disponibiliza um canal para a Ouvidoria no seu site.

Saiba mais

Oferecemos dois cursos que tratam dos aspectos mencionados:

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